Conferência junta uma centena de empresários em Paços de Ferreira
Juntar os empresários do sector do mobiliário em torno de uma discussão sobre alguns dos seus principais problemas foi o mote para a conferência “Mobiliário: Novos Desafios”, que decorreu no passado dia 24 de Setembro, no Parque de Exposições Capital do Móvel, em Paços de Ferreira. A iniciativa da Associação Empresarial de Paços de Ferreira (AEPF) e do jornal Imediato serviu para relevar alguns aspectos menos conseguidos deste sector tradicional da economia portuguesa, o mais importante da região do Vale do Sousa. Fortemente exportador e apresentando uma saudável balança comercial positiva, o sector do mobiliário tem sobrevivido a várias crises mas a capacidade de reinvenção tem-se mostrado algo limitada nos últimos anos. Procurando combater essa inacção, a AEPF e o Imediato desenvolveram uma conferência para discutir o futuro que espera o mobiliário e quais os caminhos estratégicos que podem ser ainda percorridos. As várias intervenções procuraram entregar algumas respostas às principais dificuldades dos empresários. Estiveram presentes mais de 110 pessoas que assistiram interessadas à conferência, as quais avaliaram de forma positiva a iniciativa.
Cluster do Mobiliário define regras futuras
No sentido de enquadrar o sector no novo Cluster do Mobiliário, uma iniciativa governamental que junta as associações sectoriais e empresariais desta actividade económica, o director executivo Joaquim Pinto traçou o historial deste organismo desde os primórdios em que se sentavam à mesa as câmaras municipais e as associações empresariais de Paços de Ferreira e Paredes. Um longo caminho foi trilhado desde então por todos os agentes económicos do mobiliário, até chegar-se aos dias de hoje. Actualmente, assegura Joaquim Pinto, o Cluster do Mobiliário serve, sobretudo, para “influenciar o futuro do sector”, estando a ser preparados diversos projectos, o mais importante dos quais relacionado com a internacionalização, para o qual foi desenvolvida uma marca promocional associada ao futebol, ao fado e ao vinho do Porto.
Empresas devem envolver-se nos centros tecnológicos
Crítico da estratégia do ex-centro tecnológico do mobiliário, entretanto extinto, Gonçalo Lobo Xavier considera que a sua existência “foi um erro, ou não teria falido”. Para o director executivo da Rede de Centros Tecnológicos de Portugal, a vontade de criar dois novos centros tecnológicos para o sector do mobiliário “é uma oportunidade para corrigir o erro”. Lobo Xavier alertou, contudo, para a necessidade das empresas e dos empresários se reverem nas estruturas associativas dos centros tecnológicos, ou seja, que devem ser as empresas os principais accionistas das mesmas, evitando a “intromissão” do Estado nestes organismos. “Um centro tecnológico não sobrevive com apoio estatal mas através da prestação de serviços de, pelo menos, 50 por cento do orçamento”, acrescentou. Na sua opinião, os modelos de sucesso têm seguido estratégias de inovação aberta, de parceria entre empresas e com os fornecedores. Então, como convencer os empresários a adquirirem os serviços dos centros tecnológicos? “Através de recursos humanos qualificados”, respondeu Lobo Xavier, para quem as universidades e os institutos politécnicos ainda não conseguem responder às solicitações das empresas dentro dos prazos exigidos pelo mercado.
A importância da parceria e dos estudos estratégicos
Um sector tradicional que soube mudar o paradigma do seu modelo de negócio e tem sido apontado como um excelente exemplo de união é o do calçado. O responsável pelo Gabinete de Estudos da associação sectorial APICCAPS apresentou a grande evolução que o calçado viveu nas últimas décadas. Segundo João Maia, depois do crescimento fabuloso da década de 80 e excepcional da década de 90 do século passado, o sector do calçado viveu tempos conturbados. A Ásia domina a produção em quantidade, enquanto a Europa modificou o seu modelo de negócio e cresceu em valor, assumindo cerca de 40 por cento das exportações mundiais em valor. Os tempos em que não era preciso um departamento comercial acabaram, referiu João Maia, tendo sido fundamental para a afirmação do calçado português a aposta em inovação, tecnologia, design e marketing dos anos 90. Graças a esse investimento, as empresas portuguesas são, actualmente, as mais avançadas do mundo em termos tecnológico. Por outro lado, desde 1978 que o sector realiza estudos estratégicos, coincidentes temporalmente com os novos quadros comunitários de apoio, os quais são seguidos escrupulosamente. Estes têm assentado, substancialmente, em três vectores: internacionalização, qualificação dos recursos humanos e inovação. O sector do calçado tem, assim, crescido em valor, aumentado as exportações (mais de 95 por cento da produção destina-se ao mercado internacional), alicerçado por grandes empresas que controlam todo o processo e investem em marcas próprias, deixando o papel produtivo para as estruturas mais pequenas. Em dez anos, acrescenta João Maia, o preço médio por par de calçado português duplicou e ganhou quota de mercado em países como Espanha e Itália. Um modelo que serve os interesses de todos, através do trabalho em parceria.
O exemplo da união enquanto “porta de saída”
Dentro do sector do mobiliário, a empresa Móveis Viriato Hotel Concept tem sido um caso de sucesso nas últimas décadas, sendo o maior exportador nacional para o sector hoteleiro, segundo afirmou o seu gestor, António Rocha. Recentemente, juntou-se a mais sete empresas para criar a Hi Global, uma entidade única que trabalha o nicho de mercado da hotelaria, que diminuísse a “falta de escala, a massa crítica e a capacidade de resposta” das empresas de forma isolada. Além de todo o tipo de mobiliário, esta nova empresa tem capacidade para fornecer soluções praticamente chave na mão. Esta “plataforma de produtores”, que se apresenta sem intermediários, logo mais concorrencial do ponto de vista de preço final, trabalha em todo o mundo, com capacidade de resposta quase imediata a qualquer pedido de consulta efectuado. A criação deste cluster hoteleiro é, antes de mais, “uma porta de saída”, porque as oito empresas no seu conjunto facturavam, há alguns anos, cerca de 500 milhões de euros, enquanto hoje, em resultado da crise mundial, esse valor ronda os 200 milhões de euros.
Saber quem são os clientes é fundamental
Raquel Reis, docente de marketing e consultora de várias empresas nesta área, considerou que se “fala muito de crise, de internacionalização, mas muito pouco do que os clientes querem”. Afirmou faltarem estudos de marketing que permitam “descobrir novas oportunidades, segmentar o mercado e conhecer os clientes” porque, segundo Raquel Reis, há muitas empresas “que não sabem quem são os seus melhores clientes, tratando-os todos por igual”. Por outro lado, afirmou que de “nada serve a qualidade e a capacidade de resposta sem [as empresas] o comunicarem aos clientes”.